sábado, 23 de janeiro de 2016

O Monge e o Touro



 
Capa de O Monge e o Touro, Monja Coen Rôshi.

Este pequeno livro é uma belíssima versão da Monja Coen Rôshi, a qual fez a tradução e os comentários de Os dez desenhos de domar o touro Jûgyûzu, originalmente criados pelo monge Kakuan Shion Zenji, mestre Zen do século XII. O mestre Zenji pertencia à linhagem Yôgi (Escola Zen Rinzai) na China antiga, e muitos de seus trabalhos são ainda estudados, e essa obra, especificamente, já foi traduzida e reproduzida de diversas formas nos últimos oitocentos anos.

Os desenhos de Zenji no Jûgyûzu ilustram o desenvolvimento espiritual de um praticante ao entrar no Caminho até completar o seu treinamento. A simplicidade e os ensinamentos do livro traduzem conhecimentos que mestres ancestrais apontam para darmos início à nossa jornada espiritual. A partir da metáfora do touro indomável, podemos entender que na verdade somos seres perfeitos, completos, mas que nossa jornada espiritual ou o Caminho da Iluminação é um trabalho árduo e profundo, no qual devemos mergulhar para acessarmos a essência do nosso próprio ser. 

Nas palavras da Monja Coen, o touro pode representar, à primeira vista, a característica bestial e selvagem que deverá ser domada em nós. Mas ele representa nosso Eu verdadeiro,  e a ignorância, na verdade, é a própria imagem humana, representada na busca por algo desconhecido, ou externo a nós. Todos nós vivemos condicionamentos e preconceitos os quais devemos enxergar, conhecer e acessar para agirmos de maneira mais essencial. Assim, as pegadas e as pistas indicadas nos desenhos de Kakuan Zenji mostram-nos as etapas necessárias para atingir esse conhecimento.

Em outras palavras, talvez devamos conhecer nossa natureza, ou o que nos habita todo o tempo, mas que não prestamos atenção. A tendência é buscarmos fora de nós a realização ou a verdade essencial, pensando que estas estão em outro lugar ou dependem de algo externo a nós. E muitas vezes seguimos em uma busca inútil, inócua, mas devemos apenas olhar com um pouco mais de atenção e lucidez para aquilo que já temos, ou seja, devemos buscar em nós o Caminho. Os condicionamentos    ou o touro e a sua fúria    nós carregamos todo o tempo, mas é necessário ater-nos  a eles, conhecê-los profundamente e domá-los para acessarmos a natureza pura, simples e verdadeira que está presente em nós.

Os comentários da Monja Coen em sua versão do texto são simples e transparentes como a água, e tocam-nos de maneira sutil, sem, no entanto, retirar a descoberta e a beleza do texto original, que também está ao final do livro. Não posso deixar de falar do cuidado gráfico do livro e das ilustrações de Fernando Zenshô, que são belíssimas e surpreendentes, ele que, na verdade, foi o idealizador deste projeto.

Posso dizer que é uma honra e um deleite penetrar nessa versão, para desvendar os rastros do touro, entender a sua forma e perceber que ela é uma entre todas as outras formas, ou que a essência de cada coisa não é diferente daquela do ser humano. E que o Caminho não começa nem acaba, ele está aí, e é necessário percorrê-lo. Enfim, um livro lindo a ser apreciado e praticado.


 

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