Alguns livros nos fazem melhores
porque encantam com o que é absolutamente novo, desconhecido. Outros, porque
desconstroem nossa forma rígida de pensar, criando uma fissura capaz de nos
levar de volta ao abismo da dúvida, do espanto, da excitação. Depois de muito tempo, considero estes
últimos os mais belos e essenciais.
Bouguereau, "Dante et Virgile au Enfers", 1850.
Nos Cursos de Estética, Hegel
diz-nos que “a finalidade da arte está em trazer ao nosso sentido tudo o que
possui um lugar no espírito humano. Ela deve usar da riqueza de conteúdo do
interior humano e, por meio dela, completar a experiência natural de nossa
existência exterior. Ela deve excitar paixões, de maneira que as experiências
da vida não nos deixem insensíveis e então possamos alcançar a predisposição
para todos os fenômenos”. Mas essa excitação não se dá pela experiência
efetiva, e sim apenas por sua aparência, uma vez que a arte coloca
ilusoriamente suas produções no lugar da efetividade. Assim, o homem deve
exercer o seu poder de representação e intuição através da arte, podendo,
inclusive, representar coisas que não são efetivas como se o fossem. A arte deve nos afligir e alegrar, nos
comover e abalar.
Hegel também diz que “a arte deve superar a brutalidade,
domar os impulsos, as inclinações e paixões”. A paixão pode apoderar-se do homem,
quando este afirma: “A paixão é mais
forte do que eu”. A arte suaviza essa brutalidade pois coloca o homem perante o
que ele sente e faz em tal estado singular de paixão. Pela arte o homem toma
consciência do que ele é imediatamente, percebendo seus impulsos e inclinações
como exteriores a si. Estando esses impulsos objetivamente à sua frente, ele já
começa a se libertar deles. Dessa maneira, é um alívio expressar o interior em
palavras, imagens, sons e formas. O homem pode, por meio da arte, livrar-se do
aprisionamento de um sentimento e se tornar consciente dele como algo que lhe é
exterior, com o qual ele apenas deve relacionar-se de modo ideal. A arte coloca
o homem fora da prisão da natureza, fazendo-o se deparar consigo mesmo como ser
único e vivente, expressivo, sensível. Segundo Hegel, a arte, portanto, também
tem como sua finalidade essencial a purificação
das paixões, a instrução e o aperfeiçoamento moral.